Tudo sobre tudo

* Milton Medran

Falei nele na crônica Primavera na Alma, publicada em 25.10.11. Um novo vizinho tinha dado vida nova àquela casa de minha rua. Viera do interior, por insistência de um filho. Acostumado às lides do campo, seguia exercitando seu amor à terra naqueles escassos metros de grama e jardim na entrada do chalé.

         A primavera se foi. No verão, ele ainda ali estava. Quando o inverno voltou, deixei de vê-lo. A grama está alta. Uma rosa teima em se sobrepor às ervas que dominam o terreno. Já não está ali a placa "bem-vindos", que ele pusera na porta. Anúncio de "vende-se" foi afixado no portão.

         Que teria havido com aquele velhinho simpático que aqui chegou, ano passado, junto com a primavera? Assim como apareceram, ele e a esposa sumiram. Teriam voltado ao interior? Não se deram bem na cidade? Ou aquela teria sido a última primavera de sua vida?

         Seja como for, chega o tempo em que a morada onde vivemos fica pequena demais para nossos sonhos. Bate a saudade de um outro tempo em que éramos livres. É a hora de voltar.

         Um filósofo da Antiguidade via o ser humano como alguém acorrentado numa caverna. Dizia que nada do que aqui vimos ou sentimos é a verdadeira vida. Imagens que se projetam na tela ao fundo da caverna são apenas sombras da realidade de uma outra dimensão, de onde todos proviemos. Um dia para lá voltaremos.

         Talvez meu vizinho sentisse que era tempo de voltar. Para sua casa no campo? Ou terá mesmo deixado a prisão da qual só nos livramos quando soltas as algemas que nos prendem a este mundo?