Art&MusicaLSlides® Manuel - "A TOGA NO CHÃO !"
José Paulo Cavalcanti Filho: Toga no chão
Adaucto Lúcio Cardoso apoiou o golpe militar, foi fundador da Arena e, em 1966, era presidente da Câmara dos Deputados. Mas não se curvava, diferentemente da grande maioria dos homens daquele tempo. E de hoje, também. Mesmo aqueles a quem nos referimos como vossas excelências.
Quando o general Castelo Branco cassou o mandato de alguns deputados, reagiu altivamente. E declarou considerar sem efeito as cassações. Por pouco tempo. Que, no fim daquele mesmo dia (20 de outubro de 1966), o Exército ocupou o Congresso Nacional.
Na reabertura dos trabalhos (em 22 de novembro), Adaucto disse não aceitar a humilhação de ver o Parlamento fechado. Uma resposta rara dada por quem apoiava o governo. Nenhum dos outros presidentes, do Senado ou da Câmara, neste e nos dois outros momentos em que o Congresso foi fechado (em 13 de dezembro de 1968 e 1º de abril de 1977), sequer protestou.
Renunciou à presidência. Mas acabou indicado para o Supremo Tribunal Federal.
Adaucto honrou a casa. Respeitava as leis. Mas sabia ouvir, também, a voz das ruas.
Tanto que concedeu habeas corpus ao líder estudantil Vladimir Palmeira e a Darcy Ribeiro, então preso. Para desgosto dos ocupantes do Palácio do Planalto, que cobravam subserviência. E a recebiam de (quase) todos. Até de juízes. Estamos falando de tempos idos, claro.
Segue a vida e, em 1971, o general Médici editou o decreto-lei nº 1.077 --que estabelecia a censura prévia de jornais, revistas e livros. Em aberta violação à Constituição de 1969, que não admitia qualquer censura. Deve ter rido, ao assinar. O general gostava de rir, senhor meu. Eram negros anos.
Naquele tempo, apenas o procurador-geral da República podia questionar a constitucionalidade das normas jurídicas. O MDB, então único partido de oposição, pediu que impugnasse o decreto-lei. E o procurador-geral, subserviente, teve o desplante de declarar que não via qualquer violação à Constituição. Nada a estranhar que haja sempre homens assim, dispostos a pagar, com decisões e votos, suas nomeações aos cargos.
O MDB entrou com reclamação diretamente no Supremo. Adaucto pôs
Ao fim da votação, apenas ele votou contra a censura. Os demais ministros exercitaram a vilania se refugiando
Adaucto declarou que seus pares envergonhavam a casa. Que não se sentia mais à vontade para conviver com eles. E jogou sua toga na curul (assim se chama a cadeira dos ministros), segundo uns; ou no chão do plenário, segundo outros. Após o que foi embora. Saiu do Supremo para entrar na história, dá vontade de repetir a frase de Getúlio. Evandro Lins e Silva, mestre querido, disse que "sua atitude foi única, continua única e provavelmente nunca se repetirá". Será?
P.S. Hoje, não estarão em julgamento os embargos infringentes. Hoje, quem será julgado é o Supremo.
* JOSÉ PAULO CAVALCANTI FILHO, 65, advogado no Recife, é membro da Comissão Nacional da Verdade
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