Art&MusicaLSlides® "O Brasil não é um país sério"

"O Brasil não é um país sério"

 

*Lourenço Nisticò Sanches

 

No início da década de 1960 ganhou destaque, e desmesurada repercussão – até os dias atuais, o episódio que envolveu a França e o Brasil originando a frase acima, em bom francês: "Le Brésil n'est pas un pays serieux".

Tudo deveu-se à pesca de lagostas no litoral nordestino, em especial Pernambuco, por parte de embarcações francesas. Pescadores brasileiros denunciaram e, a notícia espalhou-se equivocadamente chegando até o Palácio do Planalto.

O presidente à época, João Goulart, após reunião do Conselho de Segurança Nacional, mandou despachar para a região um formidável –  se considerada a "gravidade da ameaça" – contingente da Esquadra Nacional, apoiado pela Força Aérea Brasileira. De Gaulle, diante do quadro convocou o embaixador brasileiro para uma conversa formal na sede do governo francês, o Palácio do Champs Elysées.

Na noite seguinte, o embaixador Carlos Alves de Souza Filho foi convidado para uma festa na casa do presidente da Assembléia Nacional da França e, durante o evento, o embaixador foi interpelado por outro convidado brasileiro, o jornalista Luís Edgar de Andrade, correspondente do Jornal do Brasil em Paris. O jornalista perquiriu o embaixador a respeito da conversa com De Gaulle, em particular sobre o quadro geral "da crise".

Alves de Souza Filho ponderou que achava o governo brasileiro estar sendo inábil no trato diplomático da questão, chegando a mencionar durante o diálogo o "Samba da Lagosta", de Moreira da Silva, e arrematou o bate-papo citando informalmente (fora de registro) a famosa frase: "O Brasil não é um pais sério".

Este relato encontra-se em seu livro "Um embaixador em tempos de crise" – Livraria e Editora Francisco Alves, 1979, conforme transcrito a seguir:

"Provavelmente o jornalista telegrafou ao Brasil não deixando claro se a frase era minha ou do general De Gaulle, com quem eu me avistara poucas horas antes desse nosso encontro casual. Luís Edgar é um homem correto, e estou certo de que o seu telex ao jornal não teve intuitos sensacionalistas. Mas a frase "pegou". É evidente que, sendo hóspede do General De Gaulle, homem difícil, porém muito bem educado, ele, pela sua formação e temperamento, não pronunciaria frase tão francamente inamistosa em relação ao país do Chefe da Missão que ele mandara chamar. Eu pronunciei essa frase numa conversa informal com uma pessoa das minhas relações. A história está cheia desses equívocos".

E assim é que acabamos por "incorporar" um dito, resultante de uma conversa informal, como se este fora a expressão oficial da avaliação de nosso país manifestada por um dos maiores estadistas mundiais de todos os tempos.

A frase que restou famosa, e imemorável, decorrente de episódio ocorrido em 1962, portanto há 51 anos, por razões tão esdrúxulas não seria atualmente passível de reflexão? Se não, questiono: por qual razão – passado mais de meio século – ainda mantém-se viva, sendo invariavelmente relembrada e repetida por nós próprios, brasileiros?

É..., o embaixador Carlos Alves de Souza Filho – genro do ex-presidente Artur Bernardes, esculpiu em 1962, embora disso não se apercebesse, uma frase lapidar para o nosso país, infelizmente cada vez dela mais merecedor - "O Brasil não é um país sério"..., ou será que nossos políticos atuais, em sua maioria protagonistas contumazes de mal feitos envolvendo o desvio do dinheiro público não dão azo a essa pecha?

O STF recentemente já se pronunciou a respeito do maior escândalo que se tem notícia...

E a classe política... Quando é que se fará merecedora do respeito e da admiração do povo? Quando é que deixará de usar seus cargos para servir-se da nação e passar a atender exclusivamente aos interesses plurais da população, com ética e honradez?

Será que veremos chegar o dia em que poderemos "estufar" nosso peito, dizer a nós próprios e bradar para o mundo que somos um país sério?

 

 

*Lourenço Nisticò SanchesConsultor estratégico, empresarial e político – especialista em marketing, pesquisador, cronista e articulista.

 

5 de fevereiro de 2013

 

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